
A garota reclinou-se, qual gata preguiçosa num qualquer banco de jardim. A gargalhada conjugava na perfeição com o chilrear enlouquecido dos pássaros que aproveitavam o dia de sol para celebrar coisa nenhuma. Quem sabe apenas terem asas. Quem sabe terem um ninho e, talvez uma prole de crias esfomeadas à sua espera.
A gargalhada da garota semicerrava-lhe as pálpebras. Como se por momentos, fosse Alice num só seu País das Maravilhas!
Observá-la criava em nós uma devoção rara. O tempo suspenso. Sem receios. Sem preocupações. A garota, na sua gargalhada disparatada, curava todas as nossas feridas e convertia-nos à realidade inquestionável da fé.
Ela sabia.
Sabia que as maçãs não são para serem temidas. Não são para serem devoradas à pressa. Exposta na sua mãozita distraída era uma provocação e um convite. E afinal uma maçã pode ser partilhada. Uma dentada para ti, uma dentada para mim! E ela ria! Ria como se todo o jardim rodopiasse à sua volta. Como se todas as cores, todas as flores, todo o sol, todas as nuvens, todas as fontes, todos os muros e todos os carreiros estivessem lá há muito tempo. Á sua espera.
A garota sabia.
Ela cumprira a sua promessa. Estava lá. Onde tinha de estar.
Era tudo tão breve. Mas para isso temos os cliques. Cliques de eternidade. Com delicadeza, trinquei-lhe uma dentadinha de alma. Fresca, suculenta e escarlate. Ajoelhei-lhe em respeito e aí fiquei, fiquei só.
Só a saborear.